segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Porque aceitamos viajar e enfrentar o desconhecido?

 "As vezes, estamos tão
ocupados tentando vir a ser o melhor...
 que não podemos desfrutar do simplesmente ser!”
(Robert Fisher)

Nascemos em uma determinada família, em uma determinada cultura e num determinado lugar. Somos o resultado de tudo isso somado a vivência de cada individuo em seu tempo, ou seja, a maneira subjetiva como cada um de nós enxerga o que acontece a nossa volta.
            Quando viajamos, nos aventuramos para além da nossa casa, da nossa família, da nossa cultura. Nos tornamos muito vulneráveis, não só porque estamos em lugares desconhecidos e nos sentimos desprotegidos. Mas principalmente, porque estamos diante de crenças muito diferentes das nossas, que questionam nossas referências e abalam nosso equilíbrio psíquico.
Porque aceitamos viajar, sair do nosso espaço, enfrentar o desconhecido? Sempre temos que fazer uma escolha, até mesmo quando aceitamos não escolher. A viagem exprime um desejo profundo de mudança interior, uma necessidade de experiencias novas, mais do que de um deslocamento físico.
 Aceitar viajar é aceitar dar uma pausa na rotina, enxergar a vida por outro ângulo, vivenciar experiências diferentes e se permitir encarar o desconhecido: não só o que habita em outro país, mas principalmente, o que desconhecíamos em nós mesmos. Toda viagem provoca uma viagem ao interior de si mesmo.
O encontro com o outro, o estrangeiro que desconhecemos, requer uma mente aberta, o que significa não ficarmos só nos julgamentos. Temos que abrir espaço para o diálogo. A escuta do outro promove uma transformação em nós e propicia a interação, um caminho para ambos desfrutarem: porque só nos conhecemos através do outro.
Mas a idéia de estarmos num país estranho, em que se fala uma outra língua, com clima e costumes tão diferentes dos nossos, e não estarmos com tudo o que necessitamos, pode nos angustiar. O que levar em nossas malas? Queremos tornar nossa viagem a mais confortável e segura possível, é por isso, que sempre carregamos objetos que simbolizam afetivamente o amor ao local de onde partimos.
São objetos que nos relacionam à nossa casa e ao nosso chão – nenhum outro lugar no mundo nos traz mais segurança e conforto do que a nossa casa e o nosso chão. Por isso, nossas malas sempre irão estar recheadas de coisas que não precisamos, mas que nos dão segurança para lidar com tudo aquilo que iremos viver. É como se quiséssemos enfrentar o desconhecido de uma maneira já conhecida.
Mas assim como os objetos se deslocam na mala durante a viagem, mudar faz parte da vida. Como dizia o filósofo grego Heráclito: “Tudo flui. Não se pode entrar no mesmo rio duas vezes. Porque, ao entrarmos pela segunda vez, não serão as mesmas águas e nem seremos a mesma pessoa.”
Nossa bagagem é o nosso pequeno patrimônio em terras estranhas. Aos poucos vamos percebendo que a segurança maior não está nas coisas, mas em nós mesmos e na interação com o outro. Em toda viagem, assim como na vida, há uma relação de troca.
O anfitrião, seja ele o país, um parente, um amigo, enfim, quem nos recebe nos oferece abrigo, alimento etc. O viajante sempre leva o entusiasmo, a esperança, a curiosidade e a gratidão. Quem não acredita nesta relação de troca, não conseguirá desfrutar de uma viagem intensamente.
Em toda viagem, assim como na vida, quando incluímos o outro em nossos planos, estamos sendo responsáveis com a vida e, assim, estamos sendo capazes de aceitar que tudo tem o seu tempo:  independente das nossas expectativas.

Wania Prado
*Este artigo foi baseado nos livros:
1.    Tirando os sapatos, Nilton Bonder, Ed.Rocco, Rio de Janeiro, 2008
2.    O cavaleiro preso na armadura, Robert Fisher, Ed.Record, Rio de Janeiro, 2006